Ser Compliance ou Não Estar Compliance
De antemão, a primeira premissa é que não existe um conceito certo, unânime doutrinário e muito menos legal sobre o que seja Compliance. De um forma simples e direta significa conformidade, adequação. Adequação de quem ao quê? Adequação das pessoas e das empresas com relação às normas e valores em sentido amplo. No mundo corporativo ele se traduz nas ações, normas, diretrizes, processos, treinamentos, políticas, direcionamentos que são estabelecidos para negócio e para as atividades da instituição ou empresa, bem como evitar, detectar e tratar qualquer desvio ou inconformidade que possam ocorrer.
Neste contexto, o Compliance possui um duplo viés: ele tanto trata nas preocupações em garantir que as empresas estejam em conformidade com as leis, normas e regulações dos órgãos fiscalizatórios que gravitam em torno do seu ramo de atividade (ou seja, da empresa pra fora) quanto das ações para garantir que os funcionários, sócios, parceiros, prestadores de serviços, estagiários e colaboradores em geral das empresas estejam agindo da maneira correta (ou seja, da empresa pra dentro).
É neste ponto que o “agir de maneira correta” se traduz quando a empresa deixa claro as regras do jogo, os valores e os comportamentos aceitáveis, desejados e repudiados, pois como já foi dito em outro vídeo gravado em São Paulo, Compliance é questão de comportamento humano.
Aqui percebemos que o Compliance, portanto, está atrelado à boa governança corporativa, à gestão profissional, principalmente em se tratando com empresas multinacionais e de grande porte, que precisam ter esse controle sobre a atividade, blindando-se dos eventuais desvios de conduta capazes de gerar responsabilizações bastante comprometedoras.
Sua origem é norte americana e relativamente recente pois atrelada ao surgimento das agências reguladoras nos EUA em meados do século XX, sempre com a preocupação do controle, fiscalização, regulamentação, segurança e adequação às leis.
Do que se procede, quando diante da conjuntura dos dias atuais, dos escândalos em todos os países com corrupção, lavagem de dinheiro, evasão de divisas, fraudes de toda ordem – os famosos crimes econômicos e seus respectivos criminosos do colarinho branco – o compliance tem ganho popularidade entre os empresários. Foi aí que o Compliance começou a ficar mais “popular”, mais conhecido e ganhou um valor negocial muito mais forte. É um valor de sobrevivência do próprio negócio e que faz parte da agenda internacional há um tempo razoável.
Foi assim que a palavra Compliance passou a ser corrente no linguajar das organizações. Ocorre que, este conjunto de disciplinas e prescrição de comportamentos devem estar nas práticas cotidianas pois qualquer descompasso entre discurso e prática atingirá a reputação da empresa.
É por isso que grandes empresas contam com um departamento interno só para compliance, muitas vezes separado do jurídico, e esta unidade representa um sistema com uma estrutura própria de pessoas, processos, sistemas, documentos, ações e ideias que implementem o programa de compliance daquela corporação. O objeto é garantir a conformidade das ações em nome da empresa tanto em respeito às normas internas quanto às leis regentes do país, ou internacionais, sobre o negócio de atuação. Logo, o compliance é feito de forma quase personalizada, uma vez que aderente à realidade da organização para ser efetivo.
O trabalho do compliance interfere na manutenção da integridade e reputação de uma empresa. Embora os custos com Compliance tenham disparado nos últimos anos, os custos por não conformidade – mesmo que acidental – podem ser muito maiores para uma instituição. O não cumprimento de leis e regulamentos pode levar a pesadas multas monetárias, sanções legais e regulamentares, além da perda de reputação. Se você acha caro estar em Compliance, experimente então sofrer as consequências por não estar Compliance.
A título de exemplo, veja-se a Lei da Empresa Limpa brasileira (Lei no 12.846/13): a punição para os atos lesivos à administração pública na esfera administrativa sanções administrativas aplicáveis, isolada ou cumulativamente, de acordo com o caso concreto e a natureza e gravidade das infrações:
I – multa, no valor de 0,1% (um décimo por cento) a 20% (vinte por cento) do faturamento bruto do último exercício anterior ao da instauração do processo administrativo, excluídos os tributos, a qual nunca será inferior à vantagem auferida, quando for possível sua estimação; e;
II – publicação extraordinária da decisão condenatória;
Caso não seja possível utilizar o critério do valor do faturamento bruto da pessoa jurídica, a multa será de R$ 6.000,00 (seis mil reais) a R$ 60.000.000,00 (sessenta milhões de reais).
A publicação extraordinária ocorrerá na forma de extrato de sentença a expensas da pessoa jurídica, em meios de comunicação de grande circulação na área da prática da infração e de atuação da pessoa jurídica ou, na sua falta, em publicação de circulação nacional, bem como por meio de afixação de edital, pelo prazo mínimo de 30 (trinta) dias, no próprio estabelecimento ou no local de exercício da atividade, de modo visível ao público, e no sítio eletrônico na rede mundial de computadores.
Quanto será que a boa reputação de uma empresa custa? Na era digital, os ativos mais valiosos das corporações vão além dos patrimônio e qualidade de seus serviços. Basta pensar nas brigas judiciais envolvendo marcas, patentes, desenhos industriais, segredos industriais, modelos de utilidade, etc.
E isto é só um exemplo, ainda tem a desconsideração da personalidade jurídica para responsabilização pessoal dos sócios, as punições da Lei de Improbidade Administrativa, o código penal e os crimes contra a Administração, etc.
Logo, somente no âmbito administrativo, os danos à imagem da empresa podem ser comprometedores ao ponto fazer perder muitos negócios. E levam-se anos para construir uma boa reputação mas apenas segundos para destruí-la.
Ao fim e ao cabo podemos perceber que o compliance não é só para as grandes empresas (os big players do mercado), mas para todas. É evidente que são formatos diferentes, enquanto as multinacionais possuem departamentos de compliance, uma estrutura grande e alocação de recursos, as pequenas e médias empresas podem ter ações em compliance, algumas políticas, dar treinamentos às equipes e nada como uma assessoria de qualidade não ajude neste sentido.
É por isto que o Compliance veio para ficar e eu enquanto advogado e consultor para empresas, costumo dizer que em tempos de crise de valores e escândalos a toda ordem envolvendo empresários, está mais do que na hora de criarmos uma cultura legal no ambiente corporativo.
Em resumo trata-se de uma tendência internacional já consolidada e que empresas que não investem na mudança de cultura motivada pelo movimento do Compliance estarão fora do cenário de negócios e perderão competitividade de mercado. O não cumprimento de leis e regulamentos pode levar a pesadas multas monetárias, sanções legais e regulamentares, além da perda de reputação num mercado cada vez mais globalizada da era digital. Os danos à imagem da empresa podem ser comprometedores ao ponto fazer perder muitos negócios. E levam-se anos para construir uma boa reputação mas apenas segundos para destruí-la.